Tabula Rasa

Outubro 02 2009

Há muito, muito tempo, a região de Afar, no que é hoje a Etiópia, perto da actual aldeia de Aramis, 230 quilómetros a nordeste da capital Addis Abeba, era um autêntico paraíso. Uma paisagem de floresta esparsa, onde corriam cascatas de água doce, com zonas densamente arborizadas, mas também com grandes extensões de pradaria. Na floresta havia palmeiras, abundavam as figueiras e os lódãos. Era um mundo povoado de caracóis, mochos, papagaios e pavões – e ainda de ratos, morcegos, ouriços-cacheiros, hienas, ursos, porcos, rinocerontes, elefantes, girafas, macacos e antílopes. Também aí, entre os seus, vivia Ardi, uma fêmea de hominídeo primitivo. Pesava uns cinquenta quilos e media cerca de um metro e vinte. Vivia em grupo, criava os filhos e foi aí que morreu... há 4,4 milhões de anos.

O primeiro fragmento dos seus restos fossilizados – um molar – foi descoberto há 17 anos por Gen Suwa, da Universidade de Tóquio, e anunciado em 1994 na revista Nature. A seguir, entre 1994 e 1997, o resto do esqueleto (só parcialmente recuperado), em mau estado e muito fragilizado e disperso, com o crânio esmagado, foi minuciosamente libertado pelos paleontólogos dos sedimentos onde se encontrava prisioneiro. Mais de 125 fragmentos ósseos de Ardi foram assim postos a nu: crânio, dentes, braços, mãos, pélvis, pernas, pés. E também ossos de pelo menos mais 36 indivíduos da mesma espécie que esta fêmea de Ardipithecus ramidus, deste “símio do chão” (ardi, em Afar, significa “chão”). E ainda milhares de ossos de dezenas de animais e de plantas, que permitiram reconstituir, com um pormenor sem precedentes, o habitat de Ardi e dos seus congéneres.

A recuperação e a análise destes achados demorou 17 anos e centenas de pessoas participaram no projecto. E hoje, uma equipa multidisciplinar de 47 cientistas, oriundos de dez países, publica na revista Science nada menos do que 11 artigos descrevendo os resultados – alguns dos quais põem em causa ideias estabelecidas da história evolutiva dos grandes símios e dos homens.



Remontar às origens

A questão de saber como era o mais recente antepassado comum aos homens e aos grandes símios – e em particular aos chimpanzés, que são geneticamente os mais próximos de nós – é uma questão central da nossa história como espécie e prende-se com coisas como a origem do bipedismo, do crescimento espectacular do cérebro humano, etc. Pensa-se que esse antepassado terá vivido há seis ou mais milhões de anos – o que, diga-se já, exclui à partida a possibilidade de que os hominídeos da espécie Ardipithecus ramidus sejam esse antepassado comum, situados nessa bifurcação da árvore evolutiva dos primatas. Mas, mesmo assim, os autores do estudo concluem que Ardi deverá ter sido bastante parecida com esse misterioso antepassado comum – e com certeza mais parecida com ele do que Lucy, o célebre esqueleto fóssil de uma fêmea de Australopithecus afarensis, uma espécie de homens-símios totalmente bípedes, com um cérebro de pequenas dimensões, que viveu há 3,2 milhões de anos (mais de um milhão de anos depois de Ardi). Até ontem, Lucy, descoberta em 1974 não muito longe de donde foi agora descoberta Ardi, detinha oficialmente, com os seus congéneres, o título de mais antigo antepassado conhecido da espécie humana.

“Ardipithecus é uma forma não especializada que ainda não evoluiu muito em comparação com o Australopithecus”, diz num comunicado Tim White, da Universidade da Califórnia e um dos líderes da equipa de cientistas. “E quando olhamos para [Ardi] da cabeça aos pés, o que vemos é uma criatura-mosaico, que não é nem chimpanzé, nem humana.”

E é aí que começam as surpresas. Acontece que, até agora, os cientistas concordavam em dizer que os chimpanzés, os gorilas e os outros símios africanos modernos tinham conservado muitas das características físicas daquele último antepassado que partilharam com os humanos – ou seja, pensava-se que o antepassado em questão era muito mais parecido com um chimpanzé, ou com um gorila, do que com um homem. Por outras palavras ainda: enquanto nós tínhamos evoluído imenso desde aquela altura, tornando-nos muito diferentes daquele antepassado comum, os símios actuais tinham evoluído pouco desde então. Ardi vem precisamente pôr em causa essa concepção das coisas.

Pensava-se, por exemplo, que o antepassado comum aos homens e aos chimpanzés teria sido um ágil trepador, conseguindo pendurar-se nos ramos das árvores, baloiçar-se e saltar de árvore em árvore tal como os chimpanzés de hoje. E também que, tal como eles, caminhava apoiado nos nós dos dedos das mãos. Mas não foi nada disso que os investigadores descobriram ao examinarem Ardi. Como explica ainda o comunicado acima referido, quando se encontravam no chão, os hominídeos de Ardipithecus caminhavam erguidos, apoiados nas suas duas pernas (isto é sugerido pela anatomia dos pés). Uma outra ideia estabelecida pode, aliás, estar em causa aqui: a que supõe que o bipedismo dos hominídeos nasceu quando eles se lançaram para espaços mais abertos, para a savana e não quando ainda viviam na floresta. Os Ardipithecus eram “bípedes facultativos”, dizem os investigadores.

Um outro elemento surpreendente é que, conforme o que se pôde deduzir da morfologia dos dentes de Ardipithecus, este hominídeo tinha uma dieta diferente dos símios africanos actuais.

Por outro lado, Ardi não parece ter-se deslocado apoiando-se nos nós dos dedos das mãos (é o que indica a anatomia das mãos e dos pulsos, que não possuíam rigidez suficiente para isso). E também não parece ter passado muito tempo a baloiçar-se ou pendurada dos ramos das árvores. Pelo contrário, um dos artigos publicado na Science, dedicado às mãos de Ardi, qualifica-a mesmo de “trepadora prudente”, que subia às árvores, disso não há dúvidas, mas que se deslocava de gatas pelos ramos, ajudada pelo polegar oponível dos seus pés.

Se se confirmarem estes dados, isso significa, em particular, que os chimpanzés não são um bom modelo desse misterioso antepassado comum entre eles e nós – e que talvez um melhor modelo sejamos... nós próprios! É o que parece concluir no mesmo artigo sobre as mãos de Ardi a equipa de Owen Lovejoy, da Universidade Estadual do Ohio e também um dos principais investigadores. “Esta descoberta”, escrevem na Science, “põe um ponto final a anos de especulação sobre o decorrer da evolução humana. (...) Foram os símios africanos que evoluíram imenso desde os tempos do nosso último antepassado comum, não os humanos nem os seus antepassados hominídeos mais imediatos. As mãos dos primeiros hominídeos eram menos parecidas com as dos símios do que as nossas (....).”

Claro que nem todos os especialistas concordam com a interpretação dos achados e que alguns dos peritos interrogados por uma jornalista da Science, que acompanha a publicação dos resultados, permanecem cépticos. Mas todos acolheram com grande interesse os novos dados e acham que é agora que o debate vai começar.

Fonte: Jornal Público

 

publicado por Cristina às 14:20

Julho 20 2009

Há 40 anos, em 20 de Julho de 1969, o astronauta norte americano Neil Armstrong tornou realidade o sonho mais antigo das civilizações humanas, quando se converteu no primeiro homem a caminhar na Lua.
Enquanto 500 milhões de pessoas em todo do mundo esperavam ansiosamente aglomeradas junto a rádios e monitores de televisão, Armstrong desceu a escada do módulo sobre a superfície lunar.
"Este é um pequeno passo para um homem, mas um grande salto para a humanidade", disse Armstrong com a voz levemente distorcida pela distância e pelos equipamentos de comunicação, uma frase que ficaria gravada para sempre nos livros de história da Terra.
As multidões ovacionaram o momento quando Armstrong foi alcançado pelo seu companheiro Buzz Aldrin, que descreveu a "magnífica desolação" da paisagem lunar, nunca antes testemunhada.
Apenas 12 astronautas caminharam desde então pela superfície da Lua, o solitário e misterioso satélite da Terra.
Em plena Guerra Fria, o programa Apollo foi usado para provar o domínio americano na corrida espacial. Colocar uma bandeira dos Estados Unidos na superfície da Lua em 1969 marcou pontos muito importantes em relação à União Soviética.
O programa Apollo, que tornou possível seis alunagens bem sucedidas entre 1969 e 1972, começou oito anos antes, em 1961, quando o presidente John F. Kennedy lançou o desafio ao Congresso de levar o homem à Lua ainda naquela década.
"Creio que esta nação deve se comprometer em alcançar a meta, antes de termine esta década, de colocar o homem na Lua e trazê-lo de volta à Terra sem perigo", disse então Kennedy.
A decisão de chegar à Lua estava acima de qualquer decisão política, disse John Logsdon, curador e especialista do Museu Nacional do Ar e do Espaço.
A União Soviética foi a primeira nação a colocar um satélite em órbita, em 1957, com o lançamento do Sputnik e, em 1961, Yuri Gagarin converteu-se no primeiro homem a viajar ao espaço.
"A União Soviética definiu o êxito espacial como a medida de poder e atracção de uma sociedade moderna, e o presidente Kennedy decidiu que deixar um êxito espacial espectacular apenas para a URSS não era do interesse dos Estados Unidos", explicou Logsdon à AFP.
A corrida espacial converteu-se num dos símbolos da Guerra Fria pelo domínio entre ideologias enfrentadas e poderes mundiais polarizados.
Em 1970, meses depois das alunagens, o dissidente soviético Andrei Sakharov escreveu, numa carta aberta ao Kremlin, que a capacidade dos Estados Unidos de colocar um homem na Lua provou a superioridade de uma democracia.
"A Nasa havia estudado uma missão à Lua antes da decisão de Kennedy e havia concluída que não existiam barreiras tecnológicas importantes", contou Logsdon.
"No entanto, a experiência para construir os complexos sistemas requeridos para levar a cabo a missão era escassa".
Graças à crescente prosperidade dos Estados Unidos e seus êxitos científicos e técnicos, o país colocou rapidamente em marcha o programa Apollo.
Os custos da missão foram calculados em 1969 em 25 bilhões de dólares, 115 bilhões em cifras actuais e mais de seis vezes o actual orçamento da Nasa.

 

O sonho comanda a vida...

 

publicado por Cristina às 11:07

Julho 13 2009

Em Nova York, o sol ilumina a rua 42 durante o 'Manhattanhenge', fenómeno que ocorre duas vezes por ano, quando o sol se alinha com o leste-oeste do desenho formado pelos edifícios da rua da ilha de Manhattan.

Aconteceu hoje, em Nova Iorque!

publicado por Cristina às 17:47

Maio 28 2009

Nos dias 29 (a partir das 15 horas) e 30 e 31 de Maio (sexta a domingo), o edifício da Reitoria da Universidade do Porto (Praça Gomes Teixeira, aos Clérigos) vai ter as suas portas abertas para acolher a XIX da Feira de Minerais, Pedras Preciosas e Fósseis.

publicado por Cristina às 08:45

Maio 20 2009

(com nova foto) 

 

 

"Ida não conseguiu segurar-se quando os gases venosos do lago Messel, na região da Alemanha, a intoxicaram. A primata, que não teria mais de nove meses e 53 centímetros de comprimento, caiu nas águas, foi coberta pelo lodo, acabou por fossilizar e só passado 47 milhões de anos, em 1983, é que foi trazida à luz do dia. Mas a aventura do que pode ser o antepassado do grupo dos primatas superiores de que o Homem faz parte não acabou aqui.
O fóssil foi descoberto por um coleccionador privado que dividiu as ossadas em duas metades. Uma foi restaurada e vendida como se estivesse completa, acabando por ser adquirida por um museu privado em Wyoming. Em 2000, descobriu-se que era uma fraude. A outra metade, que era maior, foi comprada há dois anos pelo museu de Oslo, na Noruega.
"O meu coração começou a bater muito depressa", disse aos jornalistas Jorn Hurum, referindo-se à compra do fóssil. "Eu sabia que o vendedor tinha nas mãos um acontecimento mundial. Não consegui dormir durante duas noites", explicou o investigador do Museu de Oslo que esteve à frente da investigação, que foi ontem publicada na revista Public Library of Science. Quando o grupo começou a estudar o fóssil, rapidamente chegaram à conclusão que era a parte que faltava à metade já conhecida.
Ida, como a baptizou Jorn Hurum, é um verdadeiro achado. 95 por cento do esqueleto está bem preservado devido às condições fora de série do lago que existia na região durante a época do Eocénico (há 56 a 34 milhões de anos) e que lançava gases venenosos por haver actividade vulcânica no local. É possível ver os contornos dos pêlos e a última refeição vegetariana da primata.
Mas o que a torna tão especial é que parece ser uma antepassada do grupo de primatas superiores a que o Homem pertence, na altura em que se separou da linhagem que deu origem a espécies como os lémures, primatas inferiores e mais afastados do Homem.
Ao contrário dos lémures, Ida não tinha uma garra no segundo dedo do pé, nem tinha dentes fundidos. Por outro lado, os olhos já estavam no mesmo plano, oferecendo uma visão parecida com a nossa, e não se situavam mais lateralmente, como acontece nos lémures. A nível do esqueleto o fóssil já tinha talos, um osso do tornozelo que aparece ainda mais desenvolvido nos humanos.
"Isto mostra uma parte da nossa evolução que tem estado escondida até agora porque os únicos especímenes [encontrados] estão tão incompletos ou partidos que não há nada para estudar", explica o investigador. Os investigadores resolveram chamar à nova espécie Darwinius masillae, em honra aos 200 anos do nascimento do evolucionista Charles Darwin.
Jens Franzen, um dos investigadores, salientou que Ida não é uma antepassada directa. "Ela pertence ao grupo a partir do qual se desenvolveram os primatas superiores e os seres humanos, mas a minha impressão é que ela não faz parte da linha directa", disse, citado pela BBC News.
Mas a descoberta está a ser um êxito. Foi ontem mostrada em Nova Iorque no Museu de História Natural pelo presidente da cidade, Michael Bloomberg, e a seguir volta para Oslo. "São necessários um ou dois ícones para arrastar as pessoas para o museu. Isto é a nossa Mona Lisa e vai ser a nossa Mona Lisa nos próximos cem anos", concluiu Jorn Hurum."

Texto integralmente reproduzido da edição online do Jornal Público de hoje.

publicado por Cristina às 13:23

Fevereiro 13 2009

Mais um passo de gigante foi ontem dado pela ciência. No dia em que se comemoravam os 200 anos do nascimento de Charles Darwin, foi apresentada por Svante Pääbo, antropólogo do Instituto Max Planck, a sequência de cerca de 60 % do genoma do Homem de Neandertal.
O Homem de Neandertal (Homo neanderthalensis) é uma espécie extinta do género Homo que habitou a Europa e partes do oeste da Ásia, desde cerca de 250.000 anos atrás até aproximadamente 29.000 anos (Paleolítico Inferior e Médio), tendo a partir de dada altura coexistido com os Homo sapiens. Alguns autores, no entanto, consideram o Homem de Neandertal e os humanos modernos, subespécies do Homo sapiens (nesse caso, Homo sapiens neanderthalensis e Homo sapiens sapiens, respectivamente).
Muitas dúvidas existem quanto à forma como decorreu a coexistência entre o Homo sapiens sapiens e o homen-de-neandertal em locais como no sul da Península-Ibérica ou na Dalmácia. Há quem defenda que a baixa densidade populacional da época permitiu que os dois não tenham estabelecido contacto, evitando qualquer forma de, hibridação. Outros autores, porém, baseando-se, por exemplo, na descoberta de um fóssil de um menino de quatro anos conhecido como o "Menino de Lapedo", em Vale do Lapedo, Portugal, crêem que está provada a ligação e cruzamento do homem moderno com o "Homo sapiens neanderthalensis", sendo que a população actual seria resultante dessa miscigenação. Outros autores, ainda, preferem uma abordagem de “meio termo”, crendo que poderão ter existido contactos pouco relevantes a nível cultural e mesmo genético, já que podiam, até, considerar-se como espécies assumidamente diferentes.
Esta discussão, complexa, tem gerado alguma polémica entre os autores que preferem uma abordagem genética e paleoantropológica e aqueles que dão maior importância ao contexto cultural da evolução humana. Teorias como a conhecida "Out of Africa", ao propor que o homem moderno teve origem em África e se disseminou por todo o planeta num processo de "colonização" de cerca de 80 000 anos, não admite a miscigenação entre os dois grupos. Outras teses, contudo, de carácter "regionalista", defendem que vários tipos humanos evoluíram simultânea e gradualmente, estabelecendo contactos que permitiram a emergência do Homem moderno - estes teóricos são, portanto, mais favoráveis à hipótese do cruzamento entre estes dois tipos humanos.
O certo é que, os estudos mais actuais parecem demonstrar que pouco ou nada subsiste do património genético dos Neandertais no ADN do homem actual, existiu sim, um antepassado comum ao Homo de Neandertal e ao Homo Sapiens, com uma idade de cerca de 700.000 anos, período após o qual as duas linhas evolutivas teriam seguido caminhos evolutivos diferentes. Esta tese sai agora reforçada, com a descodificação do genoma, que aponta de forma quase definitiva, para a impossibilidade da hibridação, reforçando a linha do modelo “Out of África” que excluí, por completo a nossa descendência a partir dos Neandertais.
publicado por Cristina às 12:05

Junho 2011
Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab

1
2
3
4

5
6
7
8
9
10
11

12
13
14
15
16
17
18

19
20
21
22
23
24
25

26
27
28
29
30


pesquisar
 
blogs SAPO